terça-feira, janeiro 16, 2007

E assim segue a vida

Ocasionalmente a minha vida assemelha-se a um filme de classe Z, tamanha é a sucessão de estranhos acontecimentos ocorridos. Isto à luz da minha demência fantasiosa, claro, ou não tivesse eu esta mania intrínseca de atribuir significados transcendentais - como se tal pudesse explicar a vida - a todos os mais ínfimos detalhes, incluindo a unha encravada que felizmente nunca tive. Estão, portanto, já avisados poupando-vos assim da consequente desilusão causada pelos desinteressantes acontecimentos a seguir relatados. Não esperem grande coisa.
Isto a propósito de no outro dia, estar eu preparada para levar as calças à costureira para as transformar naquilo que pode parecer aos olhos de muitos uns calções, ou seja, vulga bainha, quando oiço a campainha. Era a por mim sempre esquecida D. Fernanda a solicitar o contributo mensal pela periódica, e também esporádica, esfregadela às escadas cá do prédio.
Abro a porta. “Boa-tarde, ía mesmo agora sair e vou lá baixo levantar dinheiro”, digo eu mais uma vez culpabilizando-me mentalmente por não ter vergonha na cara e pela minha taralhouca irresponsabilidade, “ Não se preocupe, dá-me depois. Deixa no quiosque.”, diz ela enquanto interiormente, presumo eu, me desanca num chorrilho de impropérios (se fosse eu fazia-o!), “De qualquer modo tenho que sair”, remato eu. Pego no saco com as calças e fecho a porta atrás de mim e imediatamente entro num estado febril de catatonia quando me apercebo que não tenho comigo a chave de casa.
Depois de ter passado por todas as cores possíveis e imagináveis, incluindo a fantástica e não menos famosa cor-de-burro-quando-foge-mas-o-que-é-que-eu-faço-agora-meu-deus-que-eu-entro-em-pânico, e depois de ponderar chamar os bombeiros e assim ter alguma adrenalina na minha vida, a simpatiquíssima mas por mim esquecida D. Fernanda sugere-me que vá ao chaveiro da rua. Bem-dita senhora! Foi assim que assisti em primeiro mão, o que não é para todos, ao arrombamento da minha porta de casa. A maioria nunca assiste a este delicado processo. Já encontra a porta arrombada.
Escusado será dizer que toda eu irradiei luz de alívio e que até as orelhas sorriram ao ouvir aquele deífico som da porta abrir. Segui então para a rua, cantando e rindo qual Julie Andrews em Música no Coração, com um dos propósitos que me tinha feito sair de casa para me deparar com a porta fechada da costureira. Azar. É por esta altura que uma qualquer engrenagem dentro de mim ganha movimento e eu começo a especular um futuro cataclismo, e espero a qualquer instante ser abalroada por um camião TIR. Isso, ou ir contra um poste.
Mas não. O que sucedeu a seguir, no supermercado, foi no mínimo para mim inédito. Ao chegar à caixa, a quantia a pagar era exactamente, sem tirar nem pôr, a quantia de dinheiro que tinha comigo: 3,43€. E pela primeira vez, desde que a minha mãe ma ofereceu, a minha carteirinha de pelúcia rosa-choque, ficou completamente vazia. Nada. Niente. Nem um cêntimo. Zero. E eu senti-me, com não sentia há muito, estranha e profundamente liberta. E segui flutuando...

(poderia agora dissertar como o dinheiro nos monopoliza e escraviza, contudo penso que estamos todos cientes disso. ou não?)

1 Comments:

Blogger Jörf said...

lol - muito bom! O dinheiro só serve para nos distrair da vida, minha doce e, ao mesmo tempo, rebelde Anäk. Quem é que dizia que os registos não casavam - o tanas é que não! Muito bom regresso! Beijos do outro polinizado...

terça-feira, janeiro 16, 2007 1:08:00 da manhã  

Enviar um comentário

<< Home